Bruxa do 71
As pessoas costumam dar risada quando eu falo que quero ser como a bruxa do 71. Não exatamente como ela, mas eu quero ser uma velha esquisita, livre. Eu quero ser aquela velhinha rabugenta mas que no fundo é doce, quero fazer bolos pra casa ficar cheirando bem, ao mesmo tempo que ralho com as crianças do vizinho pelo barulho. Quero ter cabelo violeta de quem exagerou no produto pra deixar os cabelos brancos ainda brancos. Quero ser aquela que dão risada porque vive exatamente a vida que sempre quis viver, sem pensar em ser aceita, sem pensar em encaixar. Sempre associei essa ideia com a velhice porque entendia que somente depois do descarte social eu poderia ser essa mulher. Hoje eu comecei a pensar diferente, hoje eu quero ser essa pessoa agora. Eu quero enxergar a magia do cotidiano e falar disso sem me importar se alguém vai rir de mim. Eu quero ir morar num sítio e comer pitanga do pé. Talvez ter uma galinha que bica as canelas. Uma casa com janela circular e um sofá confortável pra ler, cheio de almofadas com capa de crochê. Quero ter sempre alguma erva secando pendurada na porta da cozinha. Quero fazer fogo na lareira em dia de neblina. Quero ter gavetas cheias de quinquilharias e pequenos tesouros. Quero isso tudo agora.